Aposta de privatizações puxa ações de energia
Índice setorial acumula alta de 40% este ano. Analistas ainda esperam consolidação
19/07/2016

O GLOBO - São Paulo - 18.07.2016 - A mudança de governo tem aumentado a expectativa em relação a uma nova onda de privatizações e venda de ativos por parte das companhias do setor de energia, que esperam também um menor nível de intervenção e maior estabilidade regulatória. Aliado a isso, 2016 vem registrando um maior volume de chuvas que em anos anteriores, o que reduz os problemas de abastecimento dos reservatórios. Essa combinação de fatores, explicam analistas, somada a perspectivas favoráveis para o setor, contribui para que os investidores apostem com força nas ações das empresas de energia elétrica. Com isso, estas acumulam forte alta nos últimos meses, apesar do cenário de recessão econômica.

Só neste ano, o Índice de Energia Elétrica acumula alta de 40,3%. Esse desempenho é superior ao registrado pelo Ibovespa, cujo ganho está em 28,2%. O desempenho positivo está presente em várias empresas do setor, mas a Eletrobras se destaca: a alta acumulada é de 105,4%, com os papéis terminando a sexta-feira cotados a R$ 21,44. A estatal pode vender uma fatia importante de seus ativos, o que melhoraria sua situação de caixa.

Outras companhias seguem o mesmo caminho. A Cesp, só na sexta-feira, registrou avanço de 18%, depois de o secretário da Fazenda de São Paulo, Renato Villela, afirmar que há interesse em privatizar a empresa. No ano, os ganhos chegam a 20,6%. Além das empresas que podem ser privatizadas ou vender parte de suas operações, também recebem atenção do investidor aquelas que podem comprar esses ativos. A CPFL e a Equatorial são as mais citadas como possíveis consolidadoras desse processo, em especial na área de distribuição.

VENDA DE ATIVOS

As maiores altas, no entanto, são das empresas que podem vender ativos. Nos dois casos, as companhias são estatais: Eletrobras e Cemig.

— O setor de energia subiu muito porque os investidores veem possibilidade de ganhos nesses movimentos de fusões e aquisições, a começar pela Eletrobras. Mesmo uma troca de gestão, com melhora da governança corporativa, pode ajudar a empresa — avalia Roberto Indech, analista da Rico Corretora.


Ele ressalta, no entanto, que os preços que estas empresas que precisam se desfazer de ativos vão conseguir dependerão do momento de mercado. Como algumas têm pressa em levantar recursos, a avaliação pode ficar abaixo do que seria considerado justo.

— Não adianta vender por um preço qualquer, mas também pode não ser o preço justo, porque há uma necessidade de venda — explica Indech.

Bruno Piagentini, analista da Coinvalores, ressalta ainda que houve uma forte reversão das expectativas em cima desses papéis, que vinham sofrendo desde o fim de 2012. Foi quando começou a tramitação da medida provisória (MP) 579, que mudou as regras para as renovações de concessões de energia e provocou uma reestruturação no setor. Em 2014, a estiagem em diversas regiões do Brasil prejudicou a geração elétrica e aumentou os custos para o setor.

— As notícias de privatização e menor interferência regulatória reverteram as expectativas para o setor. Essa possibilidade de consolidação, em especial entre as distribuidoras, gera boas oportunidades de negócios. Quem pode se destacar são as empresas que estão mais bem colocadas em termos operacionais — explica Piagentini.

A CPFL, para o analista, é uma empresa bem posicionada nesse sentido. A companhia já comprou, no mês passado, a distribuidora AES Sul, que atua no Rio Grande do Sul. Analistas acreditam que a companhia pode ser uma das principais agentes nesse processo de consolidação, avaliação que cresceu após a chinesa State Grid comprar os 23,6% da CPFL que estavam nas mãos da Camargo Corrêa. Os chineses têm grande interesse no setor.

— Se, de fato, houver uma menor interferência governamental, vai aumentar o apetite das empresas chinesas pelas companhias do setor de energia no Brasil — aposta Piagentini.

Outra empresa que conta com participação indireta de um grupo chinês é a EDP Energias Renováveis, cujas ações acumulam valorização de 27,8% no ano. A China Three Gorges (CTG) é uma das principais acionistas da EDP em Portugal, que, por sua vez, controla a empresa brasileira. Embora a Energias Renováveis seja vista como uma empresa mais conservadora em termos de apetite por aquisições, uma parceria com a CTG (que já está presente em alguns projetos da brasileira) poderia mudar essa característica.

Ainda do lado das compradoras, os analistas estão atentos aos movimentos da Equatorial, que já adquiriu distribuidoras no Maranhão e Pará. No caso da Cemar, os resultados já são considerados positivos para a empresa, o que poderia animá-la a fazer novas incursões em projetos ou empresas que estejam com fatias à venda.


DE OLHO NOS DIVIDENDOS

Apesar da forte valorização no ano, Raphael Figueredo, da Clear Corretora, vê espaço para uma nova onda de alta. Isso porque os papéis das empresas de energia estavam muito depreciados. No entanto, ele ressalta que é importante estabelecer limites para perdas, caso haja alguma reversão nesse processo de alta.

— Essas empresas ainda têm espaço para novas valorizações, mas o investidor precisa se preocupar com os riscos. Quanto maior a escada, maior a possibilidade de tombo. Então, se entrar agora, é importante ter uma estratégia de defesa, os chamados stops, ou seja, sair da posição — diz Figueredo.

Tradicionalmente, as empresas de energia sempre foram boas pagadoras de dividendos. No entanto, com os recentes problemas, essa condição foi prejudicada. Para este ano, os analistas esperam uma melhora marginal dos dividendos, uma vez que essas companhias ainda estão se ajustando, mas os valores devem melhorar a partir de 2017, o que também reforça a aposta nos papéis do setor.

POR ANA PAULA RIBEIRO