União busca sócio privado para retomar Angra 3
A legislação ainda prevê o monopólio do Estado, então o empreendimento tem que considerar a Eletronuclear como majoritária
12/07/2017

Valor - O governo estuda alternativas para retomar as obras da usina nuclear de Angra 3 em parceria com investidores privados. A principal ideia em avaliação é permitir uma participação máxima de 49% ao novo sócio, mantendo o controle estatal do empreendimento e, assim, não ser necessária uma mudança na Constituição.

O Valor apurou que estão no páreo quatro grupos: a russa Rosatom, a chinesa CNNC, a sul-coreana Kepco e o consórcio franco-nipônico EDF / Areva / Mitsubishi. O principal problema para o governo, porém, é encontrar uma forma de tornar rentável o investimento da ordem de R$ 17 bilhões para conclusão da usina, de 1.405 megawatts (MW) de capacidade, no litoral sul do Rio.

"A iniciativa privada quer participar, quer ajudar a financiar a conclusão de Angra 3. Tem aí discussões acontecendo, porque atualmente a legislação ainda prevê o monopólio do Estado. Então isso teria que acontecer com a Eletronuclear sendo acionista majoritária com 51%, e 49% para a iniciativa privada. Aí tem que ver o modelo econômico, para ver se vai ser rentável para as empresas", afirmou o presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan), Celso Cunha.

"Angra 3 é algo, na nossa visão, irreversível", acrescentou o executivo, destacando que, apesar de serem necessários cerca de R$ 17 bilhões para terminar o projeto, não concluir a obra custaria outros R$ 12 bilhões. De acordo com informações da Eletronuclear, braço de geração de energia nuclear da Eletrobras, até o momento 67,1% das obras civis da usina já foram executadas. O índice global de conclusão do empreendimento é de 58,4%.

Em junho, o ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, disse que o governo recebeu propostas de multinacionais, com as quais está conversando. Em reunião na Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado, ele contou que a ideia é montar uma sociedade de propósito específico (SPE) ou uma parceria público-privada (PPP), em que o parceiro privado entraria para garantir a conclusão da obra.

"Na minha opinião, faz sentido concluir Angra 3. Já foi feito muito do projeto. Estamos trocando informações com a Eletronuclear para entender o que pode ser feito. Estamos tentando entender como podemos ajudar e o que podemos fazer", afirmou ao Valor Ivan Dybov, presidente da Rosatom para a América Latina.

A cooperação binacional na área nuclear foi um dos temas discutidos entre os governos brasileiro e russo na visita do presidente Michel Temer à Rússia, em junho, embora não tenha sido assinado nenhum novo acordo sobre o tema. "Ficamos felizes por esse ponto ter sido discutido. A cooperação é importante não só na construção de usinas nucleares e no ciclo do combustível, mas também na medicina nuclear e isótopos", afirmou Dybov.

Além das conversas com a Rosatom, a Eletronuclear assinou no fim do ano passado um memorando de entendimentos com a CNNC para estudar o projeto de Angra 3 e discutir uma possível participação conjunta.

De acordo com a minuta do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2026, divulgada para consulta pública pelo Ministério de Minas e Energia na sexta-feira, a conclusão de Angra 3 está prevista para 2026.

"Angra 3 é um projeto cuja decisão de construção, de levar a frente o projeto, será tomada em uma reunião do CNPE [Conselho Nacional de Política Energética]. Mas é um projeto que está no horizonte de planejamento", afirmou na semana passada o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Luiz Augusto Barroso.

Apesar de não indicar outras unidades nucleares além de Angra 3, o Plano Decenal de Expansão de Energia sugere a necessidade de novas usinas do mesmo tipo para depois de 2026.

"Tendo em vista a necessidade latente de oferta de energia firme, a expansão nuclear surge como opção natural. Porém, o início de desenvolvimento do primeiro projeto após Angra 3 deverá ocorrer após o fim do horizonte decenal, em função dos prazos envolvidos de estudos e obtenção de licenças. Após a concretização do primeiro empreendimento, acredita-se que os seguintes poderão ocorrer em intervalos mais curtos, provavelmente de cinco a sete anos", indica o ministério de Minas e Energia no texto do PDE 2026.

O presidente da Abdan, contudo, considerou tímida a posição do governo com relação à energia nuclear no PDE 2026, ao incluir apenas Angra 3 em relação a novas nucleares no estudo.

As obras de Angra 3 estão paralisadas desde setembro de 2015, quando fornecedores interromperam serviços por falta de pagamento e, paralelamente, a Eletrobras abriu um processo interno para apurar irregularidades nos contratos do empreendimento.

Por Rodrigo Polito; colaborou Rafael Bitencourt