Liminar favorece hidrelétricas em imbróglio judicial
Nova liminar da Apine mantém congelada a inadimplência acumulada de mais de R$ 6 bilhões no mercado à vista de energia
20/02/2018

Valor - 19.02.2018 - A guerra judicial contra o déficit de geração das hidrelétricas (GSF, na sigla em inglês) ganhou novos contornos na sexta-feira, depois que uma grande associação conseguiu nova liminar que manteve congelada a inadimplência acumulada de mais de R$ 6 bilhões no mercado à vista de energia.

As hidrelétricas representadas pela Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine) foram protegidas da exposição ao GSF entre julho de 2015 e o início de fevereiro deste ano, quando a juíza Adverci Mendes de Abreu derrubou a decisão judicial que as resguardava. Ficou estabelecido, assim, que as empresas precisariam pagar na próxima liquidação do mercado de curto prazo de energia os montantes devidos e acumulados nesse período.

Na sexta-feira, porém, a Apine foi favorecida por nova decisão do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1) que manteve a limitação do GSF sobre as hidrelétricas no período em que a liminar esteve vigente. Na prática, isso fará com que as hidrelétricas afetadas não precisem desembolsar imediatamente os valores devidos.

O cenário mudou o jogo de forças entre o governo e as hidrelétricas, o que pode favorecer a retomada da negociação de um acordo para suspensão das liminares. A decisão mostrou, ainda, a importância de uma solução para a guerra judicial que também corrija o passado, conforme disse ao Valor o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia (MME), Paulo Pedrosa.

O GSF se tornou um grave problema para as hidrelétricas devido à seca enfrentada nos últimos anos. As usinas não estavam gerando toda a garantia física para proteger seus reservatórios, mas precisavam cumprir os contratos de venda de energia. Isso causava uma exposição ao mercado de curto prazo de energia, que tem preços mais elevados e voláteis.

Em 9 de fevereiro, o MME divulgou uma minuta de projeto de lei que envolve, entre outras questões, uma solução para a judicialização do GSF. O projeto de lei em questão retira da sigla tudo o que não é "risco hidrológico", como a geração de termelétricas fora da ordem de mérito, atrasos na entrada em operação das grandes hidrelétricas do Norte e também as limitações no escoamento dessa energia por atrasos em obras de transmissão.

Enquanto o projeto de lei prevê a retirada permanente desses efeitos do GSF no futuro, também prevê que o mesmo seja aplicado ao passado, com efeitos retroativos até 2013. A ideia é que as hidrelétricas protegidas por liminares paguem os montantes devidos, permitindo a normalização do mercado à vista de energia e o fim da inadimplência de mais de R$ 6 bilhões que é resultado do problema do GSF. Como compensação pelo GSF pago que não é "risco hidrológico", esses geradores teriam a extensão de suas concessões de forma proporcional à exposição, com o limite de até sete anos.

De acordo com Debora Mota, gerente de gestão de clientes do Grupo Delta Energia, a liminar deve ser positiva para o mercado de energia. "Isso dá uma percepção de que o 'bolo' não vai mais crescer. Aos poucos, os agentes vão receber um valor maior nas liquidações [do mercado à vista], e isso vai acabar sendo positivo", disse Debora. Há mais de 50 liminares limitando os efeitos do GSF sobre as hidrelétricas, mas a decisão da Apine era a mais representativa de todas elas, responsável por grande parte da inadimplência acumulada.

Por Camila Maia