Disputa em torno do GFS soma R$ 7 bi em liminares
A MP 814, que propõe uma solução para este nó e tramita no Congresso, expira em 10 de junho e não deve ser votada
24/05/2018

Valor - Um dos principais imbróglios do mercado livre de energia envolve o Generation Scaling Factor (GFS), o custo de exposição das hidrelétricas à escassez de chuvas, uma briga que já soma mais de R$ 7 bilhões em liminares que travam a liquidação de contratos no segmento.

Sempre que a geração das hidrelétricas, fator conhecido como GFS, não corresponde a 100% do volume previsto pelo sistema elétrico em determinado mês, as usinas ficam expostas, o que tem ocorrido com frequência desde 2013. O impasse pode estar longe do fim: a MP 814, que propõe uma solução para este nó e tramita no Congresso, expira em 10 de junho e não deve ser votada, segundo sinalizou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. O assunto seria resolvido por meio de um projeto de lei. Mas, por conta da base fraca do governo no Congresso, dificilmente será aprovado neste ano.

Todo empreendimento no setor despacha energia segundo orientações do Operador Nacional do Sistema (ONS). O Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) serve para que a energia seja realocada contabilmente, transferindo o excedente daqueles que geraram além de sua garantia física para aqueles que geraram abaixo, já que alguns fatores externos como chuvas e ventos podem reduzir a geração real do empreendimento. A meta é sempre buscar uma energia que seja mais barata.

Entre 2013 e 2017, faltou chuva, usinas térmicas mais caras foram acionadas, ou seja, usinas que não estavam na ordem do mérito, jargão do setor. A proposta do governo seria expurgar esse fator do cálculo e essas despesas não seriam mais rateadas pelos empreendedores que participam do MRE.

Já as usinas que sofreram com o GSF teriam seu prazo de contrato de concessão estendido por sete anos, para que não houvesse impacto nas tarifas. A princípio, a ideia poderia destravar as liquidações do mercado livre, hoje abarrotado de liminares. As geradoras que aceitassem a proposta teriam de abandonar as ações. "A solução negociada parece atender ao mercado", diz o presidente do Conselho de Administração da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), Rui Altieri.

Para ele, o temor de alguns especialistas - de que, se aprovada a medida, poderia haver inadimplência de alguns agentes que não teriam provisionado em seus balanços os valores devidos - não deve ocorrer. "Quando foram cassadas liminares no fim do ano passado de Pequenas Centrais Hidrelétricas, esses pequenos empreendimentos saldaram seus débitos sem problemas. Pode haver alguma negociação de parcelamento de dívida, mas fechado o acordo, o impasse deve ser desfeito."

Mas o GSF ainda poderá trazer disputas no futuro. "A proposta do governo estancaria a sangria atual, mas não é uma terapia para as causas do problema, que são a falência do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE) e o excesso de garantia física das hidrelétricas que compõem o mecanismo", diz o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Edvaldo Santana.

Segundo ele, não haverá solução para esse problema sem um grande acordo. "Hoje, é compulsória a participação de uma hidrelétrica no MRE, só que ela já sabe que vai gastar muito dinheiro com isso - cerca de 20% da receita. Se for mantido dessa maneira, cada vez mais ficarão inviáveis as grandes hidrelétricas."

Quando as chuvas não vêm, as turbinas hidráulicas não funcionam a plena carga, enquanto as termelétricas têm de funcionar sem interrupção para poupar os reservatórios, o que eleva o preço da energia. Sem poder atender aos contratos firmados com seus compradores, os geradores têm de ir ao mercado comprar a energia.

Desde 2013, o nível dos reservatórios sofreu redução considerável, afetando a geração das hidrelétricas. A participação no MRE assegura que sejam apropriados aos seus participantes os níveis de geração em relação a suas garantias físicas, independentemente da geração real de cada uma das usinas. Desde 1998, o setor adia uma revisão dessas garantias.

Por Roberto Rockmann