Entenda a crise da taxação da energia solar
Decisão final deve ser tomada após reunião do conselho da Aneel, marcada para dia 21
09/01/2020

O Globo - 08.01.2020 - A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) abriu uma consulta pública, em outubro, para rever parte dos subsídios para os consumidores que produzem sua própria eletricidade, o que ocorre hoje principalmente por meio de painéis solares. Ainda não houve decisão, mas o assunto gerou muita polêmica.

O tema chegou ao gabinete do presidente Jair Bolsonaro, que agora trata o assunto com uma medida para “taxar o sol”. Ele proibiu que qualquer integrante do governo trate de assunto.  Com a pressão do presidente e do Congresso, a Aneel deve recuar.

A proposta da Aneel não abrange as usinas tradicionais de energia solar e eólica, que permanecem incentivadas.

O que é

A proposta da Aneel, porém, não se trata de “taxar o sol”, mas propor um subsídio menor para quem gera sua própria energia, num modelo chamado de geração distribuída. Esse é um modelo diferente da geração centralizada, a forma tradicional de produção de energia, em usinas hidrelétricas, eólicas, solares e térmicas.

Quando um consumidor adere à geração distribuída, ele passa a produzir energia em casa ou no trabalho. Essa energia pode ser consumida imediatamente ou então ser transmitida para a rede da distribuidora e compensada depois. Nesse caso, a rede da distribuidora acaba funcionando como uma bateria.

Regra em vigor

A regra atual prevê incentivos para quem participa desse sistema, entre os quais a isenção do pagamento de tarifas pelo uso do sistema elétrico.

A tarifa de energia é composta por vários fatores. Entre eles, estão os custos da compra de energia, de transmissão de eletricidade, além de encargos setoriais (que são feitos para bancar programas e ações do próprio governo no setor elétrico. Esses valores hoje acabam sendo pagos por quem não tem sistemas de geração distribuída.

Incentivo vem desde 2012

A autorização para gerar a própria energia foi dada em 2012. Em 2015, foi previsto que a norma passaria por uma revisão em 2019.

Desde a regulamentação pela Aneel, já foram implantadas mais de 160 mil unidades consumidoras com micro ou minigeração, e houve redução de 43% do valor dos painéis solares, que possuem vida útil de 25 anos. A fonte solar é a mais utilizada na modalidade, alcançando 98% das conexões. No ano passado, o número de instalações dobrou.

Comércio tem maior potência

Casas, comércios, a indústria e o próprio poder público podem usar esse sistema. Entre números de instalações, 72% são em residências e 18% em comércio.

Mas em termos de potência, o comércio tem a maior capacidade instalada (40%), seguido das residências (36%).

Proposta da Aneel

A proposta da agência é alterar as regras sobre a energia que o consumidor gera a mais ao longo do dia e joga na rede da distribuidora de energia.

Com a mudança proposta, o consumidor passará a pagar pelo uso da rede da distribuidora e também pelos encargos cobrados na conta de luz. A cobrança será feita em cima da energia que ele receber de volta do sistema da distribuidora. Não haverá cobrança sobre o que é gerado e consumido imediatamente.

Fazendas solares

A proposta da Aneel também quer alterar a chamada geração remota, que são instalações maiores. Por esse modelo, os consumidores se reúnem em uma espécie de condomínio, gerando energia fora de seus prédios, e usando a rede da distribuidora para transportar a energia. São as chamadas fazendas solares.

O benefício é usado por consumidores de grande porte, como bancos e supermercados. O problema, diz a Aneel, é que não há pagamento pelo uso da rede.

Na prática, além de usar todo o sistema elétrico brasileiro à noite e em dias de chuva, como todos os que possuem painéis em suas próprias residências, neste caso o usuário também utiliza a rede no momento da geração, já que está a algumas centenas de quilômetros do painel que é seu (na prática, é de uma empresa que o “aluga”).

Custos

Segundo dados do Ministério da Economia, o sistema de compensação atualmente em vigor para a geração distribuída custaria ao sistema elétrico mais de R$ 56 bilhões entre 2020 e 2035.

Em estudo, o ministério argumenta que a medida não compromete o crescimento da geração solar no país: “O que está em jogo não é a fonte solar, e sim a manutenção dos privilégios de um determinado segmento da fonte solar”.

Transição

A Aneel propôs ainda uma regra de transição. Quem já tem o sistema instalado e quem pedir autorização para instalar até a publicação da nova regra fica dentro das regras atuais até dezembro de 2030.

Quem pedir a instalação após a publicação da nova regra também terá um período de transição em que pagará apenas o custo da rede de distribuição até 2030. Após dezembro de 2030, todos passarão a pagar pelo uso da rede de transmissão da distribuidora e também pelos encargos.

Por Manoel Ventura