Bancos começam a operar no mercado livre de energia
Juros baixos e demanda de clientes levam instituições ao mercado de energia
23/06/2020

Valor Econômico - 22.06.2020 - Bancos Brasileiros estão começando a atuar no mercado livre de energia, onde o fornecimento é negociado diretamente entre consumidores e geradores. O segmento é visto pelas instituições financeiras como uma possível fonte de receita e lucro, uma alternativa para compensar perdas com a queda da taxa básica de juros (Selic) para 2,25% ao ano, o menor nível da história.

No mercado livre, os preços de energia não são administrados pelo governo e, portanto, flutuam de acordo com a oferta e demanda. O segmento é mais usado pelos grandes consumidores, como indústrias e shopping centers. Com a entrada de instituições financeiras no negócio, deve ganhar liquidez e novos produtos, uma vez que os bancos passarão a comprar e vender energia. Itaú Unibanco, ABC Brasil, Voiter (ex-Indusval), BMG e Bocom BBM são algumas das instituições financeiras que estão entrando nesse mercado, segundo apurou o Valor. O BTG Pactual, pioneiro nesse negócio, e o Santander já têm comercializadoras próprias. A pandemia prejudicou a visibilidade, mas não mudou o rumo dos novos projetos.

A aposta em energia reflete a busca dos bancos por novas fontes de receita, mas reflete também tendência de maior sofisticação nas negociações da commodity. O mercado livre terá maior abertura nos próximos anos. A partir de 2023, consumidores com demanda superior a 500 quilowatts (kW) poderão escolher seu próprio fornecedor. Com isso, o volume negociado nesse ambiente, que foi de R$ 134 bilhões em 2019, deve triplicar em uma década, prevê o Santander.

Paralelamente, começam a surgir iniciativas para desenvolver no Brasil um mercado de derivativos de energia. O Balcão Brasileiro de Comercialização de energia (BBCE) recebeu autorização da CVM para atuar como mercado de balcão organizado. À frente da operação está Carlos Ratto (ex-Cetip e ex-B3), que pretende lançar em agosto uma plataforma eletrônica de negociação.

Juros baixos e demanda de clientes levam bancos ao mercado de energia

A redução da taxa Selic às mínimas históricas começa a aproximar os setores financeiro e elétrico - que têm muito em comum, mas sempre andaram separados no Brasil. Para diversificar fontes de receita e oferecer novos serviços a clientes, os bancos estão entrando em peso no mercado livre de energia, que deve ganhar liquidez e novos produtos com esse movimento.

Itaú Unibanco, ABC Brasil, Voiter (ex-Indusval), BMG e Bocom BBM são algumas das instituições financeiras que estão dando esse passo, segundo informações dos bancos ou obtidas pelo Valor com fontes de mercado. Santander e BTG Pactual - este, pioneiro no movimento - já têm comercializadoras próprias. A crise do coronavírus tirou visibilidade, mas não mudou o rumo desses projetos. A aposta em energia reflete a busca dos bancos por novas fontes de receitas, mas também é indicativa da tendência de uma maior sofisticação nas negociações da commodity. O mercado livre terá maior abertura nos próximos anos. A partir de 2023, consumidores com demanda superior a 500 kW poderão escolher seu fornecedor. Com isso, o volume negociado nesse ambiente, que foi de R$ 134 bilhões em 2019, deve triplicar em até uma década, segundo estimativa do Santander.Ao mesmo tempo, começam a surgir iniciativas para desenvolver no Brasil um mercado de derivativos de energia, hoje inexistente. O Balcão Brasileiro de Comercialização de energia (BBCE) recebeu autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para atuar como um mercado de balcão organizado.

À frente da operação está o executivo Carlos Ratto (ex-Cetip e ex-B3), que pretende lançar em agosto uma plataforma eletrônica de negociação de contratos baseados na commodity - um embrião do que pode ser, mais adiante, uma bolsa especializada no setor.O mercado livre tem pouca liquidez, risco elevado, requer capital intensivo e oferece oportunidades de arbitragem de preços, características que o tornam um terreno fértil para bancos e fundos de investimentos.

“Temos capital, uma área comercial experiente, conhecimento em crédito, um banco de investimentos maduro e uma tesouraria efetiva”, afirma Antonio Nicolini, vice-presidente de tesouraria do ABC Brasil, que já recebeu autorização do Banco Central (BC) para atuar na comercialização.

Em comum entre as instituições financeiras, estão planos de atuar na compra e venda de energia para financiar empresas do setor ou grandes consumidores do insumo. A ideia é que, na condição de contraparte, os bancos ajudem os clientes a travar um determinado preço, concedam prazo ou ofereçam a possibilidade de pré-pagamento das faturas, por exemplo.

“No fim das contas, é um mercado com risco de crédito”, disse Christian Egan, diretor-executivo de mercados globais e tesouraria do Itaú BBA, em entrevista concedida ao Valor em janeiro.O Itaú montou sua comercializadora no começo do ano, atrelada à tesouraria, e contratou Oderval Duarte, um veterano do setor de energia, para comandar a área. O banco tem planos de vender energia até mesmo a pessoas físicas quando o mercado livre puder ser acessado pelo consumidor final, como em outros países.

Oferecer produtos de crédito também é o objetivo do Voiter, novo nome do Indusval. No início do ano, o banco adquiriu a Crípton, que pertencia à Matrix Participações.

“Ter uma comercializadora permite casar as pontas, atuar com mais segurança”, afirma Fernando Fegyveres, presidente do Voiter.A área de energiado Voiter está vinculada à diretoria comercial e, segundo o executivo, o banco não tem planos de tomar riscos direcionais no ativo.No entanto, para boa parte dos bancos, a entrada no mercado livre é também uma forma de diversificar a atuação da tesouraria. Na maior parte dos casos, esse é um objetivo secundário, mas alinhado à busca por novas frentes de negócios num momento de maior competição e de queda nos spreads de crédito e das operações de trading.

“A dinâmica do setor mudou. Os produtos bancários estão mudando, e é preciso buscar novas fontes de receita”, diz Rafael Thomaz, executivo-sênior responsável pela mesa de energia do Santander.Em atividade desde maio do ano passado, a comercializadora do banco já está entre as 20 maiores do mercado e a expectativa de Thomaz é que fique entre as dez primeiras até o fim deste ano.

“O resultado para a tesouraria já é representativo”, afirma.Para quem chegou mais cedo, a entrada de novos competidores financeiros neste momento é um passo natural. “É natural e reforça nossa tese”, afirma Manoel Gorito, sócio da mesa de energia do BTG Pactual, banco que estreou no setor há mais de dez anos.

Apesar disso, o executivo avalia que o desenvolvimento de uma estrutura de mercado com maior liquidez dependerá da necessidade dos próprios agentes.As garantias exigidas, a elevada volatilidade e a falta de liquidez são fatores que fazem do mercado livre um negócio de risco. Tornou-se notório o caso da Vega Energy, comercializadora do Recife que quebrou em 2019 após uma oscilação brusca de preços, deixando R$ 200 milhões a descoberto.

Os bancos veem ineficiência no modelo atual de garantias. As comercializadoras fazem aportes mensais na Câmara de Comercialização de energia Elétrica(CCEE), o que não amortece adequadamente a volatilidade. Há discussões do setor com a Agência nacional de energia Elétrica (Aneel) para que as margens sejam semanais. “Encarece para os consumidores, mas é mais seguro para a clearing e positivo para o desenvolvimento do mercado”, diz Ronaldo Torres, contratado pelo ABC Brasil para comandar a área de comercialização.