MP da crise hídrica repete Eletrobras e ganha ‘jabutis’
A medida provisória que prevê ações emergenciais para evitar racionamento recebeu 248 emendas no Congresso
06/07/2021

Valor Econômico - 03.07.2021 - Depois do festival de “jabutis” incluídos no projeto de privatização da Eletrobras, a MP 1.055 — medida provisória que prevê ações emergenciais para evitar um racionamento de energia — recebeu 248 emendas no Congresso Nacional. Algumas delas seguem a mesma lógica: definir uma reserva de mercado para determinadas fontes de eletricidade, como ocorreu com térmicas a gás natural na MP da Eletrobras.

Uma emenda do deputado Zé Vitor (PL-MG), por exemplo, prevê a contratação obrigatória de 5 mil megawatts (MW) de novas usinas movidas a biomassa em leilões realizados até 2027. Elas deverão suprir energia em contratos de 15 anos. A justificativa do parlamentar é que essas térmicas poderão evitar a emissão anual de 2,4 milhões de toneladas de carbono e poupar 5% da água nos reservatórios de hidrelétricas do Sudeste/Centro-Oeste.

Outro objeto dos deputados é o fim do desconto de 50% no uso das redes de transmissão e de distribuição por fontes renováveis (eólica, solar, pequenas centrais hidrelétricas). Esse incentivo, aplicado na tarifa-fio, era uma forma de aumentar a participação dessas fontes na matriz elétrica. Aos poucos, no entanto, elas foram ganhando competitividade e a conta dos subsídios foi chegando à casa dos bilhões de reais.

Por isso, em agosto de 2020, o governo resolveu acabar com esse desconto e deu apenas mais 12 meses para o registro de novos projetos com acesso ao incentivo. Houve uma corrida para novas outorgas na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O deputado Eduardo Costa (PTB-PA) quer dar mais seis meses de prazo.

Muitos integrantes da oposição, especialmente do PT e do PSol, viram a oportunidade de interromper o processo de privatização da Eletrobras. Diversas emendas propõem a realização de referendo popular sobre o assunto ou até a retirada imediata da companhia do Programa Nacional de Desestatização (PND), que permitiu o início de estudos.

Já uma emenda do deputado Danilo Forte (PSDB-CE) liberaliza completamente o mercado de energia. A partir de 2023, todos os pequenos consumidores — hoje clientes “cativos” das distribuidoras — poderiam escolher seus próprios fornecedores, uma condição hoje restrita à indústria e ao grande comércio com demanda de pelo menos 1,5 MW.

Com a simpatia do Ministério da Economia, o Senado emplacou mudança semelhante na MP da Eletrobras, mas com uma transição gradual e portabilidade total da conta de luz da conta de luz a partir de 2026. Na votação final da Câmara, porém, essa emenda acabou sendo rejeitada.

Na linha mais sustentável, o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP), ex-presidente da Comissão de Meio Ambiente, quer fixar em lei que 50 mil MW de energia fotovoltaica centralizada (em parques solares contratados por meio de leilões) devem entrar em operação até 2030, mais do que quintuplicando toda a potência instalada atualmente.

Esse montante entraria em um “plano de metas” do Ministério de Minas e Energia, devendo ser incorporado obrigatoriamente ao planejamento da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). “Para ter mais diversidade no sistema, de forma a não depender apenas da fonte hidrelétrica, o que está causando uma crise hídrica e possível apagão no Brasil”, argumentou Agostinho.

A MP 1.055 cria a Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética (Creg), com plenos poderes para mexer nas vazões de rios e usinas hidrelétricas, cujas decisões hoje dependem do Ibama e da Agência Nacional de Águas (ANA). Também simplifica procedimentos para contratação de energia elétrica, como reserva de capacidade, em caráter excepcional e temporário.

Por Daniel Rittner e Rafael Bittencourt