Projetos de eólicas no mar esbarram em falta de regulamentação da União
Dos 55 processos em curso, só dois apresentaram EIA/Rima; ambos foram rejeitados
03/08/2022

Valor Econômico - A sinalização do governo federal em estabelecer diretrizes para projetos eólicos em alto-mar (offshore) foi o gatilho para que empresas e investidores entrassem com mais vontade no segmento. Segundo dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), hoje são 55 processos por licenças ambientais que estão em análise, que somam 133 gigawatt (GW). Há um ano, eram apenas 23.

Entretanto, até o momento somente duas empresas apresentaram Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima). Ambos foram rejeitados por estarem em desacordo com o Termo de Referência (TR) Padrão. Os demais projetos estão em fase inicial e o órgão aguarda os planos de trabalho dos empreendedores.

O receio é que a demora de estudos sobre a viabilidade possa atrasar o desenvolvimento do setor. Por lei, o Ibama tem prazo que varia de 6 a 12 meses para analisar um EIA/Rima após apresentação pelos empreendedores. Este estudo pode levar de 12 a 36 meses para a sua elaboração desde a fase de planejamento.

De acordo com o órgão, cerca de 90% dos atrasos no andamento dos processos de licenciamento ambiental estão relacionados à qualidade dos estudos ambientais, que não trazem informações suficientes para atestar a viabilidade do projeto.

A Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica) acredita que a primeira contratação de projetos poderá ser feita em 2023 a partir de um leilão de reserva. Contudo, isso depende de uma definição mais clara do governo sobre as regras de cessão de uso do espelho d’água, que deve sair até dezembro deste ano, se tudo correr bem.

A dirigente da associação, Elbia Gannoum, lembra que o aumento dos pedidos de licenciamento ocorreu a partir do momento em que se começou a falar da regulação da cessão de uso, no decreto nº 10.946, dando mais segurança de mercado

“Os agentes identificaram áreas potenciais e entraram com o processo no Ibama para garantir lugar na fila. Porém não existe claramente uma regra de como vai ser essa cessão de uso”, explica a executiva.

O presidente do Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês), Ben Backwell, entende que é de vital importância para o setor que uma estrutura regulatória e legal seja definida e implementada. “Isso fornecerá uma visão de longo prazo e demonstrará uma rota viável para o mercado. Isso dará à indústria e aos investidores a certeza de que eles precisam fazer os enormes investimentos necessários”.

Grandes do setor, como Neoenergia, têm interesse. O tema tem atraído atenção até de petroleiras como a Shell e a Equinor. também novas empresas no Brasil, como a Ocean Winds, joint venture entre a EDP Renováveis e a Engie, com a vantagem de que ela já tem experiência em mar aberto.

Só que o Ibama sinalizou que não vai conceder nenhuma licença antes que a regra seja estabelecida. Neste contexto, o que resta às empresas é aguardar.

“Fazer estudo no mar é muito caro e as empresas que entraram com pedido de licenciamento tem um lugar na fila, mas elas não vão se aprofundar e gastar dinheiro se não têm a titularidade da cessão de uso”, diz Gannoum.

A diretora executiva do Instituto Internacional Arayara, Nicole Oliveira, vê como uma nova fronteira energética para ampliar a capacidade de geração em fontes renováveis, mas cobra seriedade e rigor nos estudos de impacto ambiental e protagonismo social na tomada de decisões, por se tratar de uma tecnologia nova para o país.

“Diferente das plantas de geração onshore [em terra], cujos impactos ambientais são, de certa forma, mais facilmente administráveis, as eólicas marítimas demandam um cuidado maior por ser um ambiente extremamente sensível, riquíssimo em biodiversidade, que já vem sendo ameaçada pelas mudanças climáticas.”

Por: Robson Rodrigues