Com demanda disputada por investidores, governo do Paraná sai do controle da Copel
A oferta “follow-on” de ações da elétrica, em tranches primária e secundária, movimentou R$ 5,2 bilhões, um terço do montante da procura pelos papéis
09/08/2023

Valor Econômico - A companhia paranaense de distribuição e geração de energia elétrica Copel foi privatizada nesta terça-feira (8), após concluir sua oferta subsequente de ações (“follow-on”). A empresa precificou na noite de ontem suas ações em R$ 8,25, com uma oferta que movimentou, no total, R$ 5,21 bilhões, a maior oferta de ações do ano até aqui.

A transação registrou alta demanda dos investidores, com mais de R$ 15 bilhões de reservas, segundo fontes, o que permitiu um baixo desconto, de apenas 0,5% em relação ao fechamento do dia.

A elevada procura por parte de investidores permitiu que todas as ações do lote suplementar fossem também vendidas. Isso, é claro, além da tranche principal. Com isso, o Estado do Paraná embolsou R$ 3,16 bilhões com a oferta, na qual vendeu parte de suas ações, deixando, ao final, o controle da empresa.

Por sua vez, a Copel aproveitou a operação para reforçar seu caixa, ganhando fôlego para fazer frente aos investimentos já contratados e levou R$ 2,04 bilhões da operação. Com esses recursos, a companhia pagará o bônus de outorga para renovação das concessões à União.

O interesse dos investidores foi grande desde antes do lançamento da oferta, o que permitiu que a mesma fosse lançada “coberta”, ou seja, já com demanda suficiente para o volume a ser vendido.

A oferta da Copel pegou “carona” com a percepção de melhora de Brasil, com aprovação de arcabouço fiscal e upgrade pela agência de classificação de riscos Fitch Ratings, além do início de corte de juros pelo Banco Central (BC).

A Copel, em tranche primária, embolsou R$ 2,04 bilhões para fazer frente a seus investimentos
O fundo Zimmer, um dos maiores investidores do mundo em companhias de utilities, foi um dos compradores, apurou o Valor. Segundo fontes, a formação da base de acionistas após a oferta foi pensada para contribuir na nova fase da Copel como companhia privada, e nas suas próximas “evoluções”.

O governo do Paraná partiu antes da operação de uma participação de 69,7% do capital ordinário, ou seja, com direito a voto, e de 31% do total. Como foram vendidos todos os lotes, o governo ficou com uma participação de cerca de 27% do capital com direito a voto e 15,6% do capital total. Assim, deixa o controle da companhia para ser um acionista de referência.

Ao longo do processo, para conseguir destravar a privatização, a Copel criou ação de classe especial - a velha conhecida em privatizações -, chamada “golden share”, com poder de veto. Visa, com isso, garantir os investimentos da Copel Distribuição, principal braço da elétrica. Além disso, o seu novo estatuto excluiu os dispositivos da lei das estatais e limitou o poder de voto de qualquer acionista a no máximo 10%, mesmo dispositivo adotado na privatização da Eletrobras.

Ao longo do processo de reuniões com investidores, segundo fontes, houve um reconhecimento do mercado sobre a boa composição do conselho e administração executiva da companhia, sob o comando de Daniel Slaviero.

A operação de venda de parte da Copel marcou, mais uma vez, um modelo de privatização realizado em bolsa de valores. Esse tipo de transação deverá ser ainda adotado por outras estatais, visto que esse desenho tem sido apontado como mais transparente para as desestatizações.

Foi assim, por exemplo, que a Eletrobras foi privatizada há pouco mais de um ano, em uma oferta multibilionária de mais de R$ 30 bilhões. Nesse caso, no entanto, ao contrário da Copel, a privatização foi feita via capitalização, o que diluiu a participação da União para menos do que 50%.

A privatização da elétrica paranaense ganhou tração após a reeleição do governador Ratinho Jr. (PSD-PR). O dirigente evitou falar em desestatização durante a campanha, mas com a vitória nas urnas com mais de 70% e maioria na Assembleia Legislativa, o governador viu o caminho livre.

Antes de terminar o ano de 2022, a empresa já concentrava esforços para viabilizar o processo. A companhia desistiu de participar de leilões de transmissão, deixou de lado o aprofundamento de estudos para uma potencial alienação da termelétrica Araucária (UEGA) e deixou de lado a venda de sua fatia majoritária na distribuidora de gás Compagas.

Outro motivo para a pressa visava aproveitar a janela regulatória e manter o controle acionário da hidrelétrica Foz do Areia, que terá sua concessão vencida no final de 2023. Pelas regras do setor elétrico, o contrato entre União e a estatal para o uso da usina se encerra em setembro de 2023 e as concessionárias poderão ter as outorgas renovadas por 30 anos, desde que privatizem a maior parte das operações.

A venda da Copel avançou com o pragmatismo do governo federal, sob a gestão de Lula (PT).

O anúncio dos ministérios de Minas e Energia e da Fazenda em estabelecer bônus de outorga de R$ 3,71 bilhões para a renovação da concessão das hidrelétricas Foz do Areia, Segredo e Salto Caxias - que juntos somam 4,17 gigawatts (GW) de potência e representam 62% da capacidade de geração da Copel - foi considerado por analistas políticos, especialistas no setor elétrico, pelo mercado financeiro e por fontes do alto escalão da companhia como um aceno de que o governo federal não iria se intrometer na privatização da elétrica paranaense. O processo contou com o aval do Tribunal de Contas da União (TCU).

No âmbito estadual, a pressão foi grande, por ser um reduto eleitoral de Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT. A oposição se empenhou, sem sucesso, em uma ofensiva para impedir a privatização da Copel. Apesar de seguir um modelo igual ao da Eletrobras, o cenário se desenhou mais favorável, uma vez que não houve inserção de jabutis, jargão político para classificar emendas incluídas em projetos de lei cujos temas não tenham relação entre si.

Na reta final da privatização da Copel, um pedido do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), acionista minoritário da companhia, criou um ruído no processo de venda da elétrica. O fato é que o BNDES, sozinho, não teve poder de barrar a transação, pois detém só 24% do capital total da Copel.

Foram coordenadores da oferta o BTG Pactual, Itaú BBA, Bradesco BBI, Morgan Stanley e UBS BB.