Especial: Setor elétrico cobra agilidade para modernização de marco regulatório
APINE NA MÍDIA
17/08/2023

Estadão | Broadcast - 16.08.2023 | A necessidade de avançar com rapidez na discussão de uma reforma estrutural do marco regulatório do setor elétrico ganhou os holofotes no evento Setor Elétrico, Desafios para o Novo Modelo, realizado hoje pelo Broadcast Energia em parceria com o escritório de advocacia MattosFilho.

A avaliação de representantes de diferentes instituições e segmentos do setor é que o governo precisa avançar em normas que permitam ajustar os desequilíbrios observados hoje no setor e fazer frente aos avanços tecnológicos e os desafios colocados na transição energética.

Participantes defenderam a retomada do Projeto de Lei 414/2021, que já tramita no Legislativo e trata da modernização do setor elétrico, com tratamento a questões relevantes para o setor, como a abertura do mercado livre de energia e seus reflexos nos segmentos de geração, transmissão, distribuição e comercialização.

Segundo João Mello, presidente da Thymos Energia, o setor elétrico tem uma ampla convergência entorno desse projeto, “e seria bom que ele fosse encaminhado logo”, disse ele, ao argumentar que é necessário que o governo busque junto ao Legislativo destravar essa proposta. “Fica nessa retórica imensa e nada é feito, e os problemas vão se acumulando. É basicamente o pacto entre as empresas para que tudo dê certo, e precisa que o Executivo permeie bem o Congresso e faça sua base legislativa”, argumentou.

Para a vice-presidente do Conselho de Administração e Diretora de Gestão do Mercado da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), Talita Porto, a abertura do mercado livre de energia para consumidores do Grupo A, a partir de 2024, tem um potencial de alcançar 2,8 gigawatts médios (GWmed) de carga, com aproximadamente 72 mil unidades consumidoras migrando ao longo do tempo. A fatura média de energia desses novos consumidores varia entre R$ 6 mil e R$ 10 mil, em média.

Segundo ela, das 165 mil unidades que estarão elegíveis ao mercado livre, com capacidade total de 6,5 GWmed, 37 mil já estão na CCEE. Das que sobram, nem todas terão interesse em migrar, especialmente os consumidores de categorias como irrigação, que têm subsídio de 80% na tarifa. “Há grande chance de quem nem todos tenham a migração”.

Porto disse, ainda, que a CCEE tem se preparado para atender ao novo contingente de novos consumidores do mercado livre, e citou o cronograma já apresentado ao governo na gestão anterior, de migração até 2026 para a classe rural, e de 2028 em diante para todos os consumidores atendidos em baixa tensão. “Temos trabalhado para estarmos aptos a receber todos os consumidores que vão vir para o mercado livre, quanto realmente tem potencial econômico para que possa migrar”.

Durante o evento, o consultor da PSR, Erik Rego, pontuou que embora concorde com a urgência de se endereçar a abertura total do mercado, é preciso avaliar a situação dos subsídios e reequacionar os custos do setor elétrico. “Quanto mais gente migrar, maior fica a conta para quem ficar no mercado regulado... já passou da hora de discutir porque o problema vai se arrastando e maior fica o problema”, afirmou.
 
Ele destacou que a proposta precisa avançar e comentou que um dos pontos importantes de serem observados é a interferência do Congresso na governança do setor elétrico. “A governança entre Congresso e instituições é fundamental porque o planejamento acaba saindo de quem deveria fazer e vai pro Congresso ver se é o melhor caminho”.

Já o presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine), Guilherme Velho, criticou a alocação de custos no mercado regulado, como os relacionados à segurança energética, e ressaltou que é preciso tratar dos subsídios às fontes renováveis e, principalmente, à geração distribuída (GD).

Ele destacou que também é importante avaliar medidas para permitir que haja novas demandas para a capacidade de geração brasileira, como realizar leilões de energia existente A-3, A-4 e A-5 - atualmente apenas são feitos apenas os leilões A-1 e A-2 para esse tipo de energia - e incentivar a exportação de energia para países vizinhos e que têm conexão com o Brasil, como o Uruguai e a Argentina. “Precisamos reequilibrar oferta e demanda... isso pode gerar carga nova e reduzir a sobreoferta”, salientou.

A necessidade de se equilibrar oferta e demanda e reduzir os efeitos dos subsídios também foram pontos abordados pelo diretor Jurídico da Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Wagner Ferreira.

Para ele, caso nada seja feito para solucionar a questão, a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) pode chegar a R$ 50 bilhões nos próximos anos. Além disso, ele disse que é preciso um tratamento político e jurídico para o problema das perdas não-técnicas de energia nas redes das distribuidoras e mencionou o problema que as concessionárias do Rio de Janeiro enfrentam em localidades onde o Estado tem dificuldade para atuar. “A conta vai ficar impagável, ou se dá um tratamento de política para essa perda [de energia], como se fez com clandestinidade e pirataria, ou teremos problema crítico nos próximos anos”.

Também presente no evento, a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum, disse que é preciso buscar uma solução para esse passado de subsídios e olhar para o futuro, com investidores interessados em colocar dinheiro em novos projetos no País, e destacou que o Brasil tem uma janela de oportunidades tanto no setor elétrico, quanto a cadeia industrial, devido à transição energética.

 Ela também disse que é preciso ampliar o olhar e falar em indústria de soluções energéticas, “um conceito industrial de diversas soluções que trazemos”, destacou.

Em gestação - Pelo lado do governo secretário de secretário de Planejamento e Transição Energética do Ministério de Minas e Energia (MME), Thiago Barral, comentou as ações da Pasta para avançar com a agenda regulatória e de modernização do setor elétrico.

Ele citou, por exemplo, que existe a necessidade de avançar com a discussão sobre as regras de acesso à rede de transmissão e em regulações que favoreçam o melhor planejamento da infraestrutura do setor elétrico. “Hoje temos uma quebra de paradigma, antes tínhamos um fluxo mais fácil de organizar hoje em dia o processo é diferente, a dinâmica é diferente” pontuou.

Barral mencionou, ainda, que é preciso colocar em pauta o debate sobre como fazer uma alocação mais eficiente de recursos no setor elétrico, mas também citou a necessidade de elaborar regras que deem as diretrizes para indústrias emergentes, como de eólicas offshore e de hidrogênio, ainda que no momento elas não sejam competitivas.

Ele citou que existem diversas empresas privadas interessadas no desenvolvimento de projetos eólicos em alto mar, por isso seria uma obrigação do governo remover as barreiras que impedem o avanço desses projetos por falta de segurança jurídica. Já no que diz respeito ao hidrogênio, citou que até 2030 o País tende a ter uma produção de hidrogênio entre as mais competitivas do mundo, mas considerou que para esse desenvolvimento a regulação é importante.

Por Wilian Miron e Luciana Collet