Brasil capta US$ 2 bi no mercado na 1ª emissão de títulos verdes
Demanda de investidores estrangeiros por papéis do Tesouro que trazem o selo de boas práticas em ESG chegou a US$ 6 bi
16/11/2023

O Estado de SP - 14.11.2023 | Papéis do Tesouro trazem o selo de boas práticas nas áreas ambiental, social e de governança (ESG) e tiveram alta procura por investidores estrangeiros. Os títulos servirão de referência para emissões de empresas brasileiras e representam compromisso do governo com políticas sustentáveis.

O governo brasileiro captou ontem US$ 2 bilhões (por volta de R$ 9,8 bilhões) no mercado internacional na primeira emissão de títulos verdes do Tesouro Nacional, com o selo de boas práticas nas áreas ambiental, social e de governança, mais conhecidas pela sigla ESG. A venda faz parte da agenda verde do governo.

A procura dos investidores internacionais pelos papéis foi alta e atingiu US$ 6 bilhões (R$ 29,4 bilhões), o que levou o Brasil a subir a oferta inicial do lote, que era de US$ 1 bilhão. A taxa de retorno ao investidor (“yield”, no jargão do mercado) será de 6,50% ao ano.

O papel servirá de referência para emissões de empresas brasileiras baseadas também nas premissas do ESG. Entre os países latino-americanos, os principais emissores de títulos verdes são o México e o Chile, mas a Colômbia também emite esse papel.

Para o Tesouro, a emissão representa um novo marco na gestão da dívida pública, com o compromisso do governo com políticas sustentáveis, acompanhando o crescente interesse de investidores estrangeiros e a expansão do chamado mercado de títulos “temáticos”, como títulos verdes, no mundo.

O novo título sustentável foi emitido com taxa final somente 0,15% acima da dos papéis do México, país que já tem há muito tempo a nota de grau de investimento conferida pelas agências internacionais de classificação de risco. O Brasil já teve o grau de investimento, mas perdeu o selo de bom pagador em 2015.

O título tem prazo de sete anos (longo), com vencimento em 2031, e foi vendido com spread (diferença entre os títulos brasileiros) de 1,80% acima do título do Tesouro dos Estados Unidos. O spread despencou e ficou bem abaixo também da última emissão do Brasil (emissão normal, uma vez que esta foi a primeira de títulos verdes), realizada em abril, quando o título saiu a 2,85% acima dos papéis americanos.

‘JANELA’ - Depois de concluir todo o processo para a emissão do título verde, a “janela de oportunidade” para a venda ficou muito difícil nos meses de setembro e outubro, com o mercado internacional operando com taxas altas e bastante voláteis.

Na semana passada, no entanto, as condições do mercado externo melhoraram com a leitura dos analistas de uma probabilidade maior de o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) aliviar a atual política monetária. O mercado deu uma acalmada e um conjunto de países voltou ao mercado internacional – entre eles, Colômbia e Costa Rica, seguidos agora pelo Brasil.

A operação foi liderada pelos bancos Itaú BBA, JPMorgan e Santander. Para lançar esse título, o governo preparou um documento, chamado de arcabouço, que é uma espécie de “carta de visita” para os investidores estrangeiros comprarem o título do Brasil, com base numa lista de despesas em programas ambientais e sociais do Orçamento – que vão lastrear os papéis. Essa lista funciona como um “menu” de despesas elegíveis para as futuras captações.

É por meio do arcabouço que o Brasil se compromete com os potenciais compradores dos títulos da dívida externa do País a usar os recursos captados em políticas sustentáveis. Os projetos enumerados em cada emissão têm duração de 24 meses, mas serão acompanhados até o fim do prazo de vencimento do papel por meio de relatórios de execução e de impacto.

Aos investidores internacionais, o governo destacou que um dos objetivos de suas emissões externas é criar referência para as empresas brasileiras emitirem no exterior. No caso das emissões ESG, essa relação é até mais importante, pois muitas não acessam o mercado externo sem a referência da República.

Numa análise sobre onde se concentram as emissões externas ESG das empresas brasileiras, o Tesouro percebeu uma preferência pelo prazo de sete anos. Esse foi o principal fator que levou o Tesouro a escolher um título com esse prazo para a emissão inaugural ESG, segundo apurou o Estadão. Entre as emissões ESG de empresas desde 2022, a maior parte foi com prazo de sete anos, seguida por dez, cinco e três anos.

CARTEIRA - Antes do anúncio da emissão, o Tesouro já tinha indicado as programações orçamentárias que terão prioridade como lastro na primeira emissão. A primeira emissão considera preferencialmente gastos de 2023 e 2024.

A carteira proposta é preponderante em categoria ambiental, destacando-se esforços para tentar reverter o ritmo atual do desmatamento no País e, por tabela, para a preservação dos biomas nativos brasileiros.

Além disso, está prevista a alocação de recursos por meio do Fundo Nacional de Mudança do Clima, em especial para o financiamento ou refinanciamento de iniciativas em favor de energia renovável e transporte limpo. O relatório mostra que a alocação de recursos para a primeira emissão seguirá os seguintes porcentuais indicativos: entre 50% e 60% dos recursos para temas ambientais e de 40% a 50% para temas sociais.

Por Adriana Fernandes